segunda-feira, 24 de março de 2008

Biografia de Eugénio Pacheco (1863-1911) - republicano e autonomista açoriano

Eugénio Vaz Pacheco do Canto e Castro (1863-1911) nasceu e morreu em Ponta Delgada tendo dedicado a sua vida ao ensino, ao jornalismo e à política – sem que nunca tenha sido político. Pertencia a uma das linhagens mais reputadas de sempre dos Açores: a família Canto, sendo sobrinho de José, Eugénio e Ernesto do Canto.
Depois de estudar Filosofia em Coimbra e em Paris regressa aos Açores onde foi professor no Liceu Nacional de Ponta Delgada (actual Escola Secundária Antero de Quental), mas foi no jornalismo que realmente se evidenciou e deu a conhecer o seu carácter irreverente.
Esta passagem, escrita por Aníbal Cymbron Barbosa num artigo biográfico sobre Eugénio Pacheco, é por demais elucidativa sobre quem foi este homem: «carácter de antes quebrar que torcer; encarnação viva duma personalidade fortemente vincada; fulguração radiante duma inteligência vigorosa; erudição vasta e profunda; paladino estrénuo desta terra; lição completa de desinteresse material absoluto; exemplo modelar da modéstia, do desassombro e da harmonia perfeita entre o ideal e a acção».
No séc. XIX existiam dois tipos de jornalismo escrito: o jornalismo “literário” e o jornalismo de “combate”. Eugénio optou sempre pelo segundo. Os seus escritos foram sempre de combate ora ao sistema monárquico (já decadente) ora ao centralismo de Lisboa. Tanto num combate como no outro sempre se fez valer do seu enorme discernimento para atacar efusivamente (recorrendo mesmo ao insulto) o moribundo regime monárquico e o centralismo de Lisboa encarnado na figura do então Presidente do Conselho de Ministros, o também açoriano Hintze Ribeiro.
Como jornalista a sua actividade foi intensa, tendo sido director e fundador de vários jornais, mas foi enquanto director do «Autonomia dos Açores» que teve um contributo decisivo para a autonomia dos Açores.
Tal como hoje, também no sistema político liberal do séc. XIX haviam dois partidos políticos hegemónicos: um de centro-direita (Partido Regenerador) e outro de centro-esquerda (Partido Progressista). Só que naquele tempo ambos alternavam entre si o poder, através de uma rede de clientelismo, assente no caciquismo eleitoral, que percorria todo Portugal, os Açores e a Madeira. O monopólio destes dois partidos e das respectivas clientelas no controlo, em regime de alternância, do Governo e dos lugares do Estado a nível central e regional levou a que politicamente, ideologicamente e socialmente ambos se tornassem indistintos. O poder central ou local era um exclusivo de uma oligarquia burocrática, intimamente ligada aos grandes interesses ligados à terra, aos meios financeiros e ao comércio.
Foi neste contexto que nos Açores nasce um movimento em prol dos açorianos que se insurge contra este estado em que se encontrava a política portuguesa: o primeiro movimento autonómico açoriano. Homens como Aristides Moreira da Mota, Gil Mont’Alverne Sequeira e Eugénio Pacheco, entre outros, definiram como meta da sua actividade conseguir eleger deputados autonomistas à assembleia nacional pela Distrito de Ponta Delgada. E conseguiram-no, vencendo inclusive as eleições legislativas de 15 de Abril de 1894 ao Partido Regenerador, de Hintze Ribeiro, com a eleição de três deputados autonomistas contra dois regeneradores.
O jornal oficial do movimento, ou seja o seu veículo de propaganda, era o «Autonomia dos Açores» e durante a campanha eleitoral foi dirigido por Eugénio Pacheco, o qual teve uma prestação de relevo para que esse inédito resultado eleitoral fosse alcançado.
Foram nestas eleições que pela primeira vez os muitos açorianos uniram-se a, quase, uma só voz contra o centralismo de Lisboa. A ideia de uns Açores autónomos ganhou finalmente consistência política e nunca mais morreu.
É por isso que não nos devemos esquecer de quem lutou, em todas as épocas, para tornar possível a actual realidade autonómica açoriana. E é por isso que não nos devemos esquecer de homenagear quem o merece. E foi por isso que vos contei esta história deste homem.
Publicado na integra no «Diário dos Açores» de 6 de Junho de 2004.

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